Dois homens de bandas australianas de sucesso internacional de diferentes eras – INXS e 5 Seconds of Summer – falam sobre encontrar espaço e seguir carreira solo.
Por Sarah Downs.
Embora separados por 35 anos de diferença de idade, Ashton Irwin e Andrew Farriss têm muito em comum. Ambos são membros de bandas nascidas em Sydney que alcançaram enorme fama internacional: 5 Seconds of Summer (5SOS), onde Irwin é baterista (mais de 10 milhões de álbuns vendidos e sete bilhões de streams); e INXS, onde Farriss foi multi-instrumentista e principal compositor (75 milhões de álbuns vendidos, tornando-os um dos maiores sucessos da música australiana de todos os tempos).
Ambos também estão se aventurando como artistas solo. Irwin lançou seu segundo álbum solo, “BLOOD ON THE DRUMS”, este ano, enquanto o segundo álbum solo de Farriss, “The Prospector”, será lançado em 2025.
Enquanto Irwin viaja pelo mundo trabalhando em novas músicas com a 5SOS e vivendo a vida de astro do rock, Andrew Farriss reflete sobre os dias intensos do INXS direto de sua tranquila fazenda nos arredores de Tamworth, um refúgio da vida agitada de estrela do rock que costumava levar.
Quando os dois músicos colocam a conversa em dia, o papo deles retorna a um tema: ‘espaço’ — tanto na música quanto na vida, algo raro em suas carreiras aceleradas.
Farriss, agora adaptado à vida rural, cercado de gado e com internet instável, encontra paz trabalhando em suas músicas solo no estúdio que construiu em casa. Irwin, em busca de seu próprio espaço, ouve com atenção. Embora possua algumas propriedades em Los Angeles, ele atualmente aproveita o ritmo mais tranquilo de um estúdio em Nashville com seus colegas da 5SOS, chegando até a compor uma música da qual se orgulha pouco antes de sua conversa com Farriss.
‘Meu foco tem sido desconstruir a ideia de que membros de grandes bandas não podem se expressar como artistas solo’ – ASHTON IRWIN.
IRWIN: Estou em Nashville no momento, em uma viagem de composição com minha banda. Onde você está, Andrew?
FARRISS: Estou na minha fazenda, que possuo há 32 anos. Com o INXS, fizemos turnês por mais de 50 países. No começo, achávamos que seria apenas pela Austrália ou América, mas acabamos indo para grandes cidades e lugares exóticos que eventualmente começaram a se confundir. Por isso me mudei para o meio do nada. Viver de malas e hotéis me fez sentir desconectado. Engraçado que Tamworth é como uma mini Nashville, mas não comprei a fazenda pela cena musical country — apenas achei que seria divertido. Trabalhar com fazendeiros, em vez de pessoas do entretenimento ou negócios, mudou minha vida.
Então, falando sobre a cena musical, acho muito saudável que pessoas de gêneros diferentes se unam. Quanto mais mente aberta as pessoas forem, mais isso criará músicas novas e ótimas combinações. O mais importante é que façam isso juntos, não separados.
IRWIN: Também se trata de tentar não se apegar ao que foi bem-sucedido no passado e se permitir seguir em frente. Com sua banda, vocês tiveram alguns dos maiores hits da história cultural australiana, sem dúvidas. Às vezes, sinto que uma música pode ser tão grande que, na próxima sessão de composição ou álbum, tudo o que consigo pensar é: “Poxa, como faço algo novo agora?” Tipo, todo mundo amou o que fizemos da última vez. Mas abraçar a reinvenção, novas influências e se tornar um nômade no processo de composição é algo em que acreditamos muito.
FARRISS: Com certeza. Eu vi o clipe de “Youngblood” que vocês filmaram no Japão. Vocês realmente foram para o Japão para gravá-lo?
IRWIN: Não, [o sucesso de] “Youngblood” veio do nada, e não tínhamos orçamento para ir ao Japão. Fomos pela primeira vez na turnê do nosso segundo álbum, onde conheci os rockabilly japoneses. Eles eram incríveis! Eu não fazia ideia de que existia uma subcultura assim no Japão. Então, quando alguém perguntou que tipo de clipe eu queria fazer para “Youngblood”, pensei em algo interessante e cultural que descobri durante as minhas viagens.
‘Vou me defender como compositor. Nos primeiros anos, nem mesmo Michael [Hutchence] estava tão interessado em compor’ – ANDREW FARRISS
Então, depois de um tempo, você pensa: “Uau, precisamos tentar fazer isso de novo”. E fica realmente complicado conforme você avança. E, claro, as pessoas podem ser inconstantes. A mídia e os fãs vão entrar e sair da sua carreira. Você vai receber aprovação ou rejeição. Não se preocupe com isso. Apenas divirta-se e faça a música que realmente quer fazer. Você pode dizer: “Acreditamos nisso, apostamos tudo nisso”, e se as pessoas não gostarem, bem, e daí? Acho que isso já diz muito, mas, claro, ainda precisamos pagar as contas, certo?
Lembro-me de quando começamos com os dois primeiros álbuns do INXS (“INXS”, de 1980, e “Underneath the Colours”, de 1981), e eles não eram muito bons. Eram mais como uma trilha sonora para nossos shows ao vivo. Colocávamos tudo nas nossas apresentações. Estávamos saindo dos anos 70 e entrando nos 80, com o punk e o new wave, e havia bandas na Austrália com um som mais pesado do que o nosso. Tinha o AC/DC, o Cold Chisel, o The Angels – todos faziam algo mais pesado. Mas viemos mais de uma área de blues e funk e misturamos isso com pop. Percebemos que precisávamos absorver um pouco dessa vibe de rock para atrair as pessoas para nossos shows, e foi por isso que escrevemos músicas como “Don’t Change”, que Bruce Springsteen chegou a fazer um cover quando veio para a Austrália – porque entendemos que precisávamos dar às pessoas o que elas queriam.
Foi estranho porque, nessa época, tivemos dois hits no Top 40 com “Don’t Change” e “The One Thing” nos Estados Unidos, na Austrália e em outras partes do mundo. Mas quando fomos fazer nosso próximo álbum, “The Swing”, tínhamos acabado de fazer uma turnê nos Estados Unidos durante os primeiros três meses de 1983. Tocamos no US Festival para um público de 250 mil pessoas no deserto da Califórnia, com The Clash, David Bowie e Van Halen como headliners. Lembro-me de sair para o palco e pensar: “Ah, droga” ao ver o tamanho da plateia. Não era mais a cena pub na Austrália – era muito mais intenso. Dei uma surtada quando fizemos aquilo.
Desculpe, estou falando demais, mas no Japão, só para conectar com o que estávamos falando antes, sobre o seu clipe. Lembro que gravamos o vídeo de “I Send a Message”, do INXS, em um enorme templo em Tóquio, um lugar que nunca havia permitido uma banda ocidental filmar lá antes. O monge-chefe, vestido com túnicas roxas e douradas, era uma figura e tanto. Michael [Hutchence] perguntou a ele por que nos deixaram entrar depois de tantos anos de isolamento, e o monge simplesmente respondeu: “Porque eu gosto de tocar trompete”. Ele pegou seu trompete, e ficamos impressionados que, depois de 1.000 anos, esse era o motivo! Soou muito budista, sabe?
IRWIN: Ele só estava pronto para tocar.
FARRISS: Exatamente, só queria se divertir. E como tem sido seguir carreira solo?
IRWIN: Meu foco tem sido desconstruir a ideia de que membros de grandes bandas não podem se expressar como artistas solo. Na 5SOS, sempre sonhamos em ser uma banda que compartilha a música uns dos outros, se ela funciona bem ao vivo. Também aprendi que compor é essencial; você precisa fazer isso com frequência para que algo realmente bom surja. Todos nós sabemos que, se ficarmos dois anos sem escrever uma única nota, será difícil voltar à ativa.
FARRISS: Entendo isso. E vou me defender como compositor. Nos primeiros anos, nem mesmo Michael [Hutchence] estava tão interessado em compor. Eu mexo com música desde os 14 anos e tinha minhas próprias bandas. Lá em Perth, cheguei a desmontar o piano do meu tio para entender como ele funcionava. Aprendi que você precisa pegar um violão acústico ou remontar o piano para criar música. Foque primeiro em acertar a melodia e a letra, depois explore a tecnologia. Isso pode levar a sons empolgantes, mas também pode fazer você se sentir como apenas mais um produto que uma corporação está tentando vender.
IRWIN: É engraçado como todos que estão fazendo música pop hoje estão usando equipamentos de 35 anos atrás, por causa das texturas e distorções sonoras únicas. Eles buscam aquele sentimento atemporal. Nós também avaliamos nossas músicas perguntando se elas funcionam sozinhas. Se não funcionam no violão ou não expressam as letras como poesia, provavelmente não acertamos. Quando você mistura uma música acústica com tecnologia – como os 12 compassos de blues em “Never Tear Us Apart” – a sinceridade brilha ainda mais na produção. Às vezes, o resultado é até melhor do que o esperado.
FARRISS: Lembro como foi empolgante ter um gravador analógico de oito canais. Também era frustrante, especialmente quando eu não conseguia me organizar. Mas isso me forçava a ver onde eu podia melhorar uma música ou precisava de um riff ou introdução melhores. É engraçado você mencionar “Never Tear Us Apart”. Durante uma turnê com o INXS na Nova Zelândia, visitamos um cara de A&R (Artista e Repertório) da nossa gravadora. Ele tinha uma casa linda, o que é típico, enquanto músicos frequentemente passam perrengue. Ele tinha uma quadra de tênis e uma sala de estar muito boas. Alguns de nós estávamos jogando tênis e tomando uma cerveja, e ele tinha um piano vertical. Eu estava trabalhando na ideia de “Never Tear Us Apart” e perguntei ao Michael, que estava entediado e odiava tênis, o que ele achava. Toquei para ele, e ele disse: “Eu realmente gosto disso. Vamos terminar”. Recentemente, alguém perguntou por que incluí aquele pequeno riff. Expliquei que um grande problema na produção e composição modernas é que ninguém sabe quando parar, entende? Não conseguem simplesmente parar e ficar quietos por um momento.
FARRISS: Espaço… a fronteira final.
IRWIN: Depois de seis álbuns, ainda estamos tentando abrir algum espaço. Você ainda está compondo?
FARRISS: Lancei um álbum solo e um EP chamado “Love Makes the World”. A última música, “First Man on Earth”, soa como se fosse do espaço sideral – nada parecido com o resto do EP. Não tem nada de pop. Meu segundo álbum solo, “The Prospector”, será lançado no ano que vem. Estou centrando as letras no tema da busca. As pessoas estão sempre procurando algo, seja uma música melhor, um relacionamento ou um amigo.
IRWIN: Você grava em casa?
FARRISS: Tenho um estúdio de gravação na fazenda desde que me mudei para cá. Nos primeiros anos, raramente convidava alguém da indústria da música; a maioria dos visitantes eram familiares ou amigos próximos. Ele fica a oito quilômetros da estrada pavimentada que leva até o meu portão.
IRWIN: Eu me vejo seguindo um caminho parecido. Estou curtindo onde estou agora, mas fico sonhando em ter um pouco de espaço.
FARRISS: Voltamos ao espaço. Não faz muito tempo, ter uma cobertura em uma grande cidade era o objetivo. Mas, à medida que o mundo fica mais lotado e precisamos de mais comida, as coisas estão mudando. No futuro, você será muito sortudo se tiver algum espaço. Desculpe, provavelmente falei demais! Estava só animado para conversar com você, Ashton.
IRWIN: Foi um privilégio falar com você, cara. Os meninos e eu sempre falamos sobre vocês e tudo o que fizeram. Vocês abriram portas bem cedo e, como jovens australianos, isso realmente nos ajudou a sonhar um pouco mais alto. Só quero agradecer pelo seu tempo, amo suas histórias, e foi um prazer conversar com você.
Fonte: Rolling Stone Australia/New Zealand
Imagens da revista: 5sostourdaily (Twitter/X)
Tradução/Adaptação: Larissa Rhouse (5SOS Brasil)
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